Depois de um longo tempo sem postar textos aqui, vai uma reflexão matinal!!!
Detalhes de uma manhã
de Verão
Por Dani Garcia
São seis e
trinta da manhã. O dia já clareou. Os poucos carros pela rua revelam que ainda
é cedo para acordar. As aulas na escola ao lado já terminaram e aquele vai e
vem de crianças, jovens e adultos não vai acontecer hoje. Preparo a mesa para o
café, os filhos dormem, dou ração e água para a cachorra e preparo o trato dos
passarinhos.
Com uma
xícara de café bem quente, pouco leite, nada de açúcar, me sento no banquinho
já estrategicamente posicionado nos fundos de casa, com vista para o quintal, e
me ponho a observar o vai e vem dos passarinhos. Pousam aqui e ali, num
constante movimento atrás do benefício diário da alimentação sem muito esforço.
Alguns
sanhaçus, mais ariscos e ressabiados, param em galhos bem acima das primeiras
árvores só para me observarem. Será que ela vai se mexer? Será que vai nos
apanhar? Que perigos vai nos oferecer? Uma incerteza e um medo que, porém, não
tiram a vontade de descer para comer a banana bem postada no comedouro, ou
entre os galhos das árvores.
Eles temem,
mas descem, na certeza de que o risco compensa o prazer de uma banana madura
para alimentar-se e alimentar seus filhotes. E assim fazem, diariamente neste
meu pequeno paraíso, os tico-ticos, saís, gaturamos, suiriris, bem-te-vis,
sabiás, tiés, vira bostas, aracuãs, saracuras, guaracavas, cambacicas, pardais,
rolinhas e ainda uma dezenas de espécies esporádicas.
Amo os
pássaros. Não me canso de olhá-los. Em cada joão-de-barro que cisca no quintal
uma particularidade, um andar, um canto diferente. À primeira vista, todos
parecem iguais. Não são! O beija-flor não para para beber o néctar que coloco
diariamente sob a árvore. Num ritmo frenético de bater de asas, se alimenta em
movimento mesmo, porque não pode perder tempo para conversar ou posar para
fotos. Quisera eu ter uma câmera melhor para capturar e eternizar todos os
momentos que os olhos conseguem captar! O cheiro do jasmim-manga se mistura,
docemente, com o cheiro do verde da bem cortada grama, exalando um perfume de natureza
excepcional.
Já não olho
o meu quintal como antes! O garapuvu do terreno ao lado, imponente, sorri para
mim do alto do seu esplendor. O pé de cortiça está ali, firme e forte apesar de
velho, a abrigar os viajantes dos céus. (E quantas maravilhas ali já pousaram!).
A alamanda já colore de amarelo o verde gramado, com seus galhos pendendo de
tanto encantar.
As
laranjeiras, limoeiros e tangerineiras já se preparam para uma nova safra de
delícias. Os pessegueiros, apressados, agora deixam cair os últimos frutos
ainda tímidos. O tapicuru atravessa o céu como uma lança, com seu bico fino e
comprido a preparar o pouso em um lugar especial.
No fundo do
quintal, observo os pés de quaresmeira a colorirem o verde da mata baixa.
Enquanto o galo da vizinha, preso e triste, canta a sua música matinal e pesarosa
-“tô ferrado...”. O sol ainda tímido, não saiu, dando até um trégua para os
que, a pé, vão ao trabalho em busca do sustento. Faz calor nesses dias de
dezembro em Balneário Piçarras, neste pedacinho pequeno de terra do Brasil, à
beira-mar.
Meu coração
bate preocupado, ansioso pelos novos desafios que virão. Mas, ao mesmo tempo,
percebo a beleza de experiências que me reservam para o próximo ano. O maior
contato com a família querida, os novos desafios da profissão, as coisas do
coração. Os desafios da vida em sociedade, com as entidades carecendo de apoio e braço disposto ao
trabalho.
Suspiro
fundo e o cheiro da natureza me dá novo ânimo. A andorinha que sobrevoa me faz querer alçar novos voos também. Mas,
como terra que sou, o voo não será alto e rápido demais, porque não posso
perder o foco nas raízes da terra. Sim, nas raízes, porque ainda sou humana. Os
estudos ajudam na compreensão do alto, na certeza da imortalidade e na
necessidade de elevar-se. Mas, é aqui ainda que estão as paixões, o cuidado com
os filhos, as necessidades diárias de quem, como eu, ainda tem muito por fazer
e resgatar.
As horas
passam, a câmera ao lado ficou parada. Sequer uma foto para registrar a manhã.
Mas, para quê? Os olhos capturam o meu momento, único e intransferível. A minha
visão do meu quintal. Um mergulho em mim mesma. As horas passam e um cantar
diferente me chama atenção. A ave está lá, majestosa a cantar no galho bem alto
do pé de cortiça.
Retiro tudo
o que disse sobre registrar o momento único. Ele é único sim, mas não posso
deixar de compartilhar com quem, diferente de mim, não tem esse privilégio de ter a
beleza ao seu redor. Levanto tiro a foto, nem sei ainda que espécie é.
Pesquisarei! Mas, enfim, olho o relógio e é hora de começar o percurso dos
dias. Obrigada, senhor, por mais um dia!