sexta-feira, dezembro 20, 2013

Como a cigarra

Como a cigarra
Por Dani Garcia


É cedo agora, o sol lá fora talvez nem vá aparecer. Não por preguiça, como fazemos nós quando não somos sol, mas para dar vez também à chuva, essencial a nós, às plantas e aos animais. Lá fora, uma cigarra faz seu canto matinal com a chegada do Natal. Um canto alto e forte, depois de um longo período embaixo da terra.
Não por coincidência, mas por necessidade talvez, no computador reproduzo no mesmo instante a canção que adoro de uma poeta argentina, na voz de la negra Mercedes Sosa, “Como la cigarra”. Uma belíssima canção e um tanto quanto inspiradora. A curiosa cigarra impõe seu canto na natureza, como anunciando as boas novas depois um período de união e amor.
Não conhecia a história desse inseto tão comum em nossa região. Nem mesmo tinha visto uma de perto, até esses dias. Foi num passeio matinal, desses que faço quase diariamente no meu quintal, que segui seu canto forte. Parecia estar muito perto, e estava! Pude encontrá-la no tronco de minha jabuticabeira.  Estava ali, parada, impondo seu canto espetacular e quase ensurdecedor. Registrei o momento para mostrar também aos meus filhos. Para que não demorassem tanto tempo para conhecê-la, assim como eu.
Fui agraciada por ver aquela cigarra. Porque, como descobri depois de uma boa pesquisa, cigarras têm seu desenvolvimento completo entre 1 a 17 anos. E nesse período de maturação, ficam enterradas. As adultas, como a que vi, habitam árvores e plantas para alimentar-se. Foi uma surpresa emocionante. Se pequenos seres como a cigarra podem permanecer soterrados em suas ninfas até estarem prontas, maduras para vir à luz, também nós podemos nos desenterrar, renascer de nossos males - que parecem eternos.
 Fiquei ainda mais feliz com o registro por entender que ali, bem na minha frente e sob o foco de minha câmara, estava um ser que poderia ter mais idade que meus filhos. E ainda sim, depois de toda a sábia reclusão que  Deus lhe impôs através da Natureza, ela retorna firme e forte, linda, em busca da vida.
Assim também somos nós. Somos cigarras vez por outra. Nos enterramos por amor, por ódio ou por outros sentimentos, e por vezes achamos que nunca mais vamos recuperar a vida e o fôlego de viver. O que precisamos compreender é que esse período de soterramento e ‘morte’ nos ensina a sermos mais fortes, mais firmes, mais vivos do que nunca. O período pode ser menor ou maior para muitos, mas não virá antes do essencial amadurecimento, sob pena de não termos força nem sabedoria para viver a graça da vida.


O Natal se aproxima aqui no sul do país, trazendo a mensagem de nascimento, renascimento, de união e amor. Um momento que muitos aproveitam para repensar suas vidas, tomar decisões e buscar a luz, assim como a cigarra. Não sei por quanto tempo cada um passou seu período de reclusão, de amadurecimento ao longo de sua breve vida. Sei que somos cigarras vez por outra e, agora, meu tempo é de cantar. 

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